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Oi Papá

Oi papá,


Faz hoje um mês que foste viver para o céu e nos mataste a todos aqui na terra! Que massacre! Como um mero ser humano pode ter tanto poder? Estamos todos desgraçados! A tua perda causou 567 casos e ainda não há recuperados. Estamos a lutar contra o vírus do luto e a planear um coup d'état, contra o governo da dor.

 

Cada dia é uma injeção de memórias, e aos poucos vou fazendo quimioterapia para curar a minha angústia. Não posso pensar porque te encontro sempre nos meus pensamentos. Parece que eu estou a lutar entre te honrar dando o devido sofrimento ou esquecer e seguir em frente. Nos puseste todos em estado vegetal em que não conseguimos fazer nada. Não consigo planear a minha vida daqui em diante porque todos os meus planos para o futuro tinham vestígios e impressões tuas.

 

Volto sempre naquele momento em que recebi a notícia…eu estava a preparar-me para dormir quando o meu telefone tocou e um amigo disse “Lunga, as minhas condolências...”  Condolências? De quê? Eu disse-lhe que ele estava enganado e que não poderia ser. A minha mente não queria aceitar mas o meu corpo já sabia, parecia que o meu corpo era um trailer do que ia acontecer mas o meu coração e a minha mente ainda estavam em discórdia.

 

O meu corpo começou a expressar dor, comecei a pular e a gritar. Comecei a dançar e a espernear, uma sanzala autêntica! A mamã que investiu tanto para ter uma filha fina tinha que me ver! Dancei até Kuduro, toques tipo os da Ashley...era um show de 'I love kuduro'. De repente, acalmei-me e liguei para a mamã e ela disse-me “Ele piorou!” mas a voz dela estava trémula, parecia que ela estava a dançar também e havia muito barulho no background. Parecia que eles ouviam a mesma batida de Kuduro e todos estavam a dar o show.

 

Hoje sei como as coisas aconteceram, a Ruth Amélia relatou-me. Ela disse que ela bateu com a cabeça; a Jandira atirou-se na areia do Pinhal Novo; a mamã ia ter com as pessoas na rua e perguntava “vocês viram o meu marido? Ele passava aqui todos os dias...vocês não viram?” e a Tiffany na sua calma, que herdou de ti papá, dizia “Por favor não gritem! Parem de dizer que o papá faleceu...”. É engraçado como até na morte é impossível não notar as vossas semelhanças. Ela encara a morte exatamente como tu, sofrendo calada, roendo-se por dentro.

 

Lembro-me de quando me contaste que o Demétrio tinha falecido, eu dei um grito e tu disseste “Lunga filha, por favor não faças barulho, a Tiffany não pode saber...” E aos poucos fomos preparando a Tiffany para aceitar a morte do seu primo querido. E agora papá? Ninguém nos preparou para a tua morte. A nossa dependência em ti é tanta que até precisamos de ti para nos acalentar na tua própria morte.

 

Já imaginei várias maneiras de receber a notícia da tua partida mas nada ia amenizar a dor. Se a minha própria mãe não teve coragem de me dizer que o homem que ela escolheu para ser meu pai, se foi, achas que uma amiga (o) por mais meigo (a) que seja, conseguiria dar a notícia da melhor maneira? Nada seria capaz de me preparar para essa disciplina da vida, eu ia reprovar sempre.

 

Pelo menos eu sofri um bocado mais tarde, enquanto a mamã e as meninas já tinham a notícia, eu só recebi a mesma uma hora ou duas horas depois. Apesar da Etiópia ser duas horas há mais do que Portugal e Angola, a mamã já estava adiantada na dor. Eu cheguei atrasada nessa roda de luto. Mas na verdade, eu já estava a sofrer há uma semana. A Nayma no dia 28 de Junho, ligou-me e disse que estavas hospitalizado e aí o pesadelo começou. Eu desliguei-lhe o telefone na cara e disse que não queria falar com ela. Só precisava de ouvir a tua voz, tentei ligar para ti e não atendeste. Mandei-te uma mensagem e finalmente respondeste e essa foi a última vez que falamos.

 

No dia seguinte, no meu aniversário, os grupos todos de família celebravam comigo então deduzi que estavas a melhorar mas eu esperava sempre uma mensagem tua a dizer "Parabéns" para concluir a minha celebração. Mas tu estavas a te preparar-te para ir celebrar o fim da tua vida. Só hoje apercebi-me que as mensagens escondiam o estado em que te encontravas e para piorar o governo da Etiópia decidiu ser cúmplice, e cortar a internet do país. Fiquei três dias sem internet, luz e água, e a volta de protestos, atentados e assassinatos...foi um inferno! Mas nada pior do que o inferno emocional que vivo agora. Enquanto eu reclamava das condições precárias de Addis Abeba, tu estavas a morrer papá.


Num dia a noite, finalmente liguei (chamada normal) para a mamã e ela explicou-me o que tinhas. Disse-me que tiveste um AVC, e para ser sincera era completamente ignorante em relação a esta lesão cerebral. Na sexta-feira, quando a internet voltou, pesquisei sobre a mesma, e falei com um amigo. Ele garantiu-me que raramente as pessoas morrem de AVC, e disse que o pai dele teve cinco AVC’s e viveu até aos 75 anos. E isso confortou-me...


A mamã disse-me que irias ficar numa 'cama’, ou numa cadeira-de-rodas mas nunca cogitamos a possibilidade de morreres! Nunca! Nunca me passou pela cabeça porque encarávamos a morte como ‘fraquejar’, como se o morto fosse culpado de ter morrido. "Achas mesmo que vou morrer?" Como é que o ser humano é tão vaidoso até na hora de partir? "Achas mesmo que isso vai acontecer comigo?" Como se a vida fosse um jogo e a pessoa que morre jogou mal. Subestimamos a vida e menosprezamos os mortos como se eles fossem ‘vencidos pela vida’, e automaticamente pusemos essa pessoa a parte.


Eu achava que nós tínhamos pago renda na terra para sempre e que eramos especiais. Mas não somos nada! Nada! E hoje vejo que pedir para ficares na terra mesmo deitado numa cama, era pedir para não viveres, mas sim veres os outros a viver. Estávamos a ser egoístas e a pensar só em nós, porque viveres numa cadeira-de-rodas ia matar aos poucos o teu espírito alegre. Mas queríamos-te tanto aqui que íamos aceitar qualquer condição.



Lembro-me que naquele dia a tarde, falei com a tia Mascote, e ela disse-me assim “Lunga, tens que entender que a situação do papá é grave! Mas eu tenho fé...para ser sincera quando perdemos o tio Raúl, eu não tinha fé que ele ia ficar bom mas agora com o papá eu tenho!” E eu apeguei-me naquela esperança, mas umas horas depois tudo desvaneceu.



Eu até hoje tenho panick attacks quando me lembro de quando finalmente obtive a veracidade da notícia. E fico a imaginar a responsabilidade da tia Mascote em ter de dar essa notícia. Não foi tão fácil como partilhar vídeos no WhatsApp, foi ‘trabalho grande’! Imagina quantas pessoas tiveram que passar a notícia a alguém e não sabiam o que dizer. Sabes papá, a tia Mascote foi a única pessoa que conseguiu dizer que tu faleceste, todo mundo mentiu-me e escondeu-me. Acho a minha tia uma das pessoas mais fortes e emocionalmente maduras que eu conheço. E entendo que ela, como médica, esteja habituada a aquele ‘entra e saí de gente’ - pessoas que entram vivas e saem sem vida, mas ela nunca pensou que tu serias uma delas.


No dia do teu funeral, não parava de pensar no funeral do Tio Rául. Estava tanto calor, estás a ver aquelas ondas que se vê quando o clima está muito quente? Eu vi as mesmas, mas eram ondas de dor, parecia que havia uma atmosfera de luto que nos cegava a todos completamente. E no zoom não foi diferente, eu estava cega de dor, fui possuída pela miopia da dor. 


A perda do Tio Raul é a única dor que se compara ao que sinto hoje, nada foi igual a isso. Tudo resto foi brincar de sofrer, eram esquebras de dor, protótipos de dor...sofrer por não conseguir algo que quero; por ter negativa na escola; sofrer por amor –aquilo tudo era dramatização. Já perdi sim amigos e já me sensibilizei com a morte de desconhecidos, mas era simplesmente a representação da minha empatia. Perder-te foi eu ver-me a morrer e ter que continuar a viver.



Volto sempre naquela noite de exorcismo... lembro-me que queria partir os vidros da janela mas depois lembrei-me que não teria dinheiro para pagar LOL. Principalmente agora, que estou desgraçada em todos os sentidos. É difícil não falar de dinheiro porque tudo move à volta dele. Lembro-me que antes de sairés de lisboa perguntaste-me se eu precisava de alguma coisa e eu disse que não. Como sempre, ‘armada em independente’, como tu. Obrigada pelo orgulho saudável que me deixaste, orgulho esse que nunca tiveste que bajular ninguém para chegares aonde chegaste. Orgulho esse acompanhado de integridade, que nunca te pôs em teias de luxúrias e tornou-te imune a ambições oscilantes.

 

Sabes papá, ás vezes sentia pena de ti porque achava que querias mais da vida mas só agora entendo que pena não era o sentimento adequado mas sim orgulho. Orgulho de te retirares de jogos sujos para manteres o teu carácter, orgulho de alguém que sofreu tantos golpes e nunca retaliou ou guardou rancor, e ainda tinha a decência de falar bem dessas pessoas. Orgulho de ter um pai que explicou-me que abrir uma empresa para servir a empresa onde trabalhas é crime e vai contra ética. Alegaste que usar o poder para este tipo de actividade era ‘abuso de autoridade’, ‘conflito de interesses’ e falta de imparcialidade. Eu era muito nova quando tivemos essa conversa, então tentaste mais uma vez explicar, usando o cenário de um filme, disseste: imagina um espião que infiltra-se numa organização e descobre as carências e depois oferece assistência. Voilá!

 

Dizer que entendi a tua partida, é mentira! Simplesmente simulo um comportamento de maturidade emocional. Sou completamente inexperiente na matéria do luto, não consigo entender nada. A minha cabeça parece um puzzle, em que sempre que encontro todas a peças para aceitar, de repente, eu própria as deixo cair e elas se perdem. Parece que eu quero controlar-me, mas qualquer coisa me descontrola. A única solução é assumir a minha identidade de maluca. Ser maluca é liberdade! É não sentir ou querer saber de nada! Mas a minha devoção a ti me traz sanidade e entendo que tenho que continuar a viver com estabilidade mental para honrar o teu legado.

 

Eu sempre tive a sensação que ia conquistar todos os meus sonhos mas uma voz dizia-me que eu teria que sacrificar algo. A minha relação com a espiritualidade e as ‘forças do além’ alertavam-me que eu ia perder um braço. Sim, um braço! De 2018 á 2019 tive três acidentes graves de viação e achei que eles eram a tentativa de amputar o tal braço mas não. Ás vezes recebemos mensagens encriptadas difíceis de interpretar mas hoje sei que o meu braço eras tu. Sinto-me completamente amputada! Estou danificada, limitada...não sei como viver sem ti!

 

Sobre os meus sonhos, eras o único que acreditava (e sei que continuas a acreditar) neles. Todas as pessoas acham a escrita algo ‘fofo’ mas nada que se deva dar tanta atenção. Mas tu cuidavas dos meus sonhos como se fossem teus; acreditavas em todos os meus projectos; apoiavas as minhas aventuras; e ouvias-me com atenção. Fazias-me sentir tão bem papá! Parecia que tu eras uma criança que tinha um boneco partido (eu) mas que te apegaste tanto a ele que não conseguias deitar...tu me fazias sentir especial papá! Às vezes sonhamos com contos de fadas e não nos apercebemos que a magia e o final feliz vivem no nosso lar. E agora o nosso conto de fadas acabou.

 

Tu apresentaste-me o mundo de ficção, falavas-me de filmes e livros da mesma maneira confiante que falavas sobre petróleo com os teus colegas. Nunca vi uma pessoa tão versátil...como era possível um engenheiro ser tão apaixonado pelo mundo de entretenimento? Contigo podíamos falar sobre tudo! Podíamos falar sobre o Chance the rapper; quem é o verdadeiro amor do Hulk (na versão da banda desenhada); o carácter do Homem-aranha (era o teu preferido); as mensagens das músicas do Bob Marley; a maneira da Rihanna de dançar; ou de como o filme ‘Girl, interrupted’ afectou completamente o estado mental da Winona Ryder. Ás vezes parecia que competíamos sobre quem era o mais erudito em ficção e cultura pop, e tu de certeza que ganhavas. Mas Papá, gostavas tanto do mundo da Marvel mas não aprendeste a ser imortal, porquê?

 

Por eu gostar tanto de escrever, perguntam-me sempre se vou escrever uma obra sobre ti. Infelizmente, não vou. Seria um desgaste emocional que eu sei que não gostarias de me por. Para escrever uma obra eu preciso de no mínimo de três meses mas eu não posso continuar a arrastar essa dor. Seriam três meses a torturar-me e eu quero por um fim a isso tudo. Se eu escolhi continuar a viver, tenho que estar bem, não posso chorar sempre que me perguntam sobre ti. Sabes, tem uma particularidade no choro do luto, sempre que choro, as minhas lágrimas são envolvidas por um sorriso. É um sentimento muito estranho mas alivia...

 

Sempre me perguntei porquê que outras pessoas não tinham a bênção de ter um pai, perguntava a Deus porquê que eu era especial... e hoje tenho algumas respostas. Hoje estou num baloiço de dúvida entre ‘ter e não ter’. Acho que preferia não ter crescido com um pai, para não sentir a tua perda. A vida é engraçada, sofremos por ter e por não ter. Ás vezes olhava para os meus irmãos de ‘coração’ e me questionava "porquê eu?" "Porquê que sou abençoada com um pai assim?" "Porquê Deus os privou de ter os seus pais por perto?" Porém, achava eles extremamente fortes por viverem sem um ‘braço’.

 

É difícil não dramatizar, porque sou naturalmente dramática, sinto tudo em excesso... uma característica que sempre me ajudou com a escrita.  E nela mais uma vez encontro conforto. Como já mencionei, não vou escrever sobre ti, até porque já faço isso desde que me afundei nesse mundo de personificações. Papá, sabias que o Armel foi inspirado em ti? O Armel é um negro num romance que escrevi sobre racismo. Apesar de viver num mundo dividido entre brancos e negros, ele diz não ver separação, ele diz que nada lhe afecta. O Armel não gostava de separatismos, e nem de guerras...exatamente como tu. Quantas vezes eu e a mamã, 'as sensíveis', tentamos desabafar contigo sobre algo que aconteceu e tu na tua maneira de estar amena e completamente isento de raiva dizias “isso é coisa da vossa cabeça!”. Dava tanta raiva papá! Nunca te ouvi a dizer que não gostavas de alguém e essa tua falta de ira era uma das característica que te tornava único. Mas hoje entendo que nada era assim tão grave, estávamos simplesmente a sofrer de ‘ilusão’, como sempre.

 

Tinhas essa mesma calma quando o assunto era negócios e investimentos, não te perdias nessa floresta vinil. A mamã dizia que nunca quiseste ser rico e eu achava aquilo um absurdo porque todo mundo quer ser rico. Mas quando conheci o Erik entendi. Vocês são iguaizinhos, ele diz sempre “eu não quero ser rico...quero ser normal”. Mas num mundo fútil, vocês são os ‘anormais’, porque o normal é viver rodeado de cobiça!

 

Tu eras a simbologia por trás da frase “Num mundo hipócrita, não ser hipócrita, é um grande defeito.” Num mundo onde todos aderem ao Eduardismo, tu eras adepto do Salazarismo. Partilhaste o quanto Salazar era incorruptível e humilde; e que ficava anos com os mesmos sapatos. Claro que a mamã não ia te deixar usar os mesmos sapatos durantes anos, mas as fábulas sobre o Salazar representam o teu ‘mantra’.  Não vou negar que também eras vaidoso e gostavas de ‘boa vida’ mas para ti, ‘boa vida’ era levar toda tua família – filhos, afilhados, sobrinhos á um resort, em vez de gastar numa loja de uma marca que todos fingem saber pronunciar o nome.

 

Com a tua partida, aprendo a valorizar certos detalhes que não gostava em mim. Sabes a tua cara ‘podre’ que só afugenta quem não te conhece de verdade, é de facto, a minha cara de ‘enjoada’. O teu andar de ‘bangão’, é sem discutir o meu gingar de ‘fidalga’. A tua maneira de ser frio a priori e de dar respostas curtas e directas, ao longos dos anos, vi que também as herdei; o teu jeito ‘agarrado’, definitivamente transferiste para mim...pergunta a mamã e a Tiffany. Quando elas tiveram aqui só lhes deixava comprar uma garrafa de água de um litro por dia. São tantas coisas que só agora vejo que devia ficar feliz por as ter, porque se elas continuam vivas em mim, assim, de alguma maneira tu continuas vivo. 

 

Apesar de seres ‘agarrado’, doavas tanto amor por onde passavas. E é isso que eu não sei se vou conseguir manter vivo em mim depois de te perder. Eu estou morta por dentro papá! Quero fazer um jejum eterno de sentimentos, estou cansada de me preocupar com pessoas que não se preocupam comigo. Sempre disseste que eu tinha um bom coração, mas o meu bom coração não conseguiu te salvar; é uma característica completamente inútil e nunca protegeu-me das armadilhas da vida.

 

Estou revoltada com a vida... mas finjo estar bem para não preocupar a mamã. Parece que a vida sabia que isso ia acontecer comigo e não me alertou. Ela deixou eu viver na minha ingenuidade que teria um pai para sempre e BOOM... acabou! Eu não tenho um pai! Confesso que estou cheia de sentimentos bipolares, às vezes aceito o que aconteceu, outras vezes não quero aceitar. Procuro coisas que me deixam mais calma mas depois oiço informações que atrofiam o meu processo de cura. Por exemplo, o tal projecto que tanto falam, que ia ser o ápice da tua carreira. Saber que estavas ansioso para algo que não conseguiste concluir magoa-me profundamente porque a vida ensinou-me que estamos aqui na terra para nos sentirmos realizados em termos profissionais. Mas encontro conforto no mundo de entretenimento – o desfecho do Michael Jackson também foi assim, ele estava a preparar-se para o tão esperado e último show ‘This is it” e antes que ele pudesse concluir Deus mandou vir-lhe buscar. Quero dizer que as pessoas de uma maneira geral vão sempre arranjar um detalhe para adicionar à dor, por exemplo: "só faltava um teste para ele concluir a faculdade", "ele ia fazer trinta anos uns dias depois", "o filho dele ia nascer dentro de meses", etc. Todo agregado a dor não significa nada, porque a pessoa já se foi.

 

Apercebi-me que talvez não entendi a mensagem da vida. O objectivo não é o trabalho mas sim as relações que deixamos na terra. Papá, tu sabes que salvaste a Tina? Sabes que a Jandira só conseguia desabafar contigo? Sabes que a Puka diz que sem ti está sem direção? Sabes que o Samory disse que depois da morte da mãe dele nunca mais tinha sentido algo assim? Sabes que a Daisy diz que és o único que lhe fizeste continuar? Sabes que a Tely diz que lhe ensinaste a ser culta? Sabes que o Telmo diz que não sabe o que vai ser de nós? Sabes que a Ruth Amélia diz que os sábados dela serão eternamente tristes porque sábado significava família/Caputo para ti e partiste num sábado? Sabes que a Nádia diz que foste o melhor pai que ela podia pedir á Deus?

 

Ainda me lembro quando conheci a Nádia, acho que foi no aniversário de dois anos do Erick. Ela era tímida, mas pela maneira que a trataste, notei logo que era mais uma vítima do teu amor. O Erick por sua vez, era insurreto, estava a correr de um lado para outro e só depois de algumas horas, consegui apresentar-me. Eu disse “Erick, eu sou a Lunga, sou tua irmã...” e ele “Tu também és filha do papa?” e eu sorri e disse “Sim”. A palavra ‘também’ indica ‘inclusão’ e definitivamente o teu agregado familiar não tinha limite, todos estavam incluídos.

 

E por isso, tive que entender que não fui só eu e as minhas irmãs que perderam um pai mas os meus primos também perderam um tio. Nos dois primeiros dias não entendia porquê que não ligavam para mim, porque a miopia da dor é tão forte que não me deixava ver nada claro. Entendi que eles também estavam a sofrer e precisam do seu espaço. O Julekas quando ligou para mim disse que não tinha coragem de falar comigo e não sabia o que dizer. Eu entendi... porque o Julekas sempre foi aquela pessoa que me ouvia e dizia “Lunga vai ficar tudo bem...” mas ele sabia que consoante a essa tragédia o seu habitual ‘vai ficar tudo bem’ era inútil. Por outro lado, o teu sobrinho e afilhado Fábio, fazia-me rir tanto, que eu vi no humor a melhor cura. A Joana fazia-me tantas perguntas "Estás aonde?" "Comeste o quê?" "Estás com quem?" que parecia que ela achava que ia atirar-me do prédio...mas eu não posso. Ainda tenho a Tiffany, o Erick e a Márcia para cuidar.

 

O Yuri Black ligava para mim todos os santos os dias para saber como eu estava mas na voz dele via-se que ele próprio estava mal, completamente mal. Posso falar dos outros Yuri’s? Nunca entendi porquê que vocês gozavam com o tio Yuri por gostar de iogurte, mas agora entendo que era uma metáfora que transmitia que ele era sensível. O tio Yuri ligou para mim para acalmar-me, mas chorava desalmadamente, nunca vi um homem a chorar assim. Papá, e o Yuri Prata? O homem a quem entregaste a nossa Tina? O Yuri parecia uma criança, a voz dele tornou-se pequena, eram só choros. Mas devo dizer que escolheste bem o teu genro porque o Yuri sei que sempre me protegerá como um irmão mais velho.

 

A tia Vanda que eu ficava anos sem ver, fala comigo todos os dias, nem que for uma imagem ou um áudio com uma música ou oração, para dizer que está comigo no pensamento. E do outro lado, no meu outro sobrenome, a Ruth Amélia diz que eras o melhor da família dela. Achei essa afirmação tão engraçada tendo em conta, que não eras ‘naturalmente’ um ‘Marques Fragoso’. Como é que conseguiste conquistar a todos? A tua irmandade com a tia Mascote era de dar inveja e a maneira como tratavas os meus tios como se fossem teus irmãos mais novos era impressionante! Comovia-me porque o que mais vejo nesse mundo são maridos que alienam as esposas das suas famílias. Papá, a mãe (Avó Joana) chora tanto... ela diz que perdeu um filho. O tio Zinho escreveu-me uma mensagem tão bonita que eu gostaria que estivesses aqui para ver e assim ficarias descansado, porque estamos bem entregues.

 

No filme Ghost Rider, o motociclista Ghost Rider tem um poder chamado ‘Penance stare’ – é um olhar que faz com que as pessoas sintam toda dor que causaram aos outros. O poder é aplicado á vilões, mas gostaria que tivesses esse poder papá, porque irias ver o quanto nos destruíste. Não te culpo por partires, fizeste de tudo para ser saudável e viveste uma vida regrada: dormias cedo; corrias todos os dias; tinhas uma alimentação cuidada; e até paraste de beber. Mas eu sei que o Senhor te queria ao pé dele. Ele queria-te tanto lá que inventou uma morte estúpida...foi tão desnecessária! Tinhas acabado de te recuperar de pancreatite ; eras tão cuidadoso com o Covid; e de repente um AVC...sério? Deus deste bandeira! Deus inventa sempre mortes súbitas quando precisa urgentemente de ajuda dos seus filhos.

 

Desculpa se não tenho os dados correctos sobre o que realmente te aconteceu porque ouvi várias versões. Vocês esconderam tanto de mim para me proteger, que agora eu encontro conforto nos detalhes dos teus últimos dias. Procurei saber o que o médico disse; se estavas a falar; se tinhas dor;  etc. Mas independentemente do que aconteceu e das várias personagens envolvidas, a história terá sempre o mesmo fim!

 

Mas tu sabias, foste dando sinais, e estavas sempre com pressa. Sentia sempre celeridade nas tuas decisões. Lembro-me da nossa última chamada, perguntaste sobre o meu próximo plano profissional e comentaste sobre o meu manuscrito. Aconselhaste-me a fazer algumas alterações nele, e como sempre mostraste interesse nas coisas que me interessam. Foste bem claro sobre o que queres para mim, e acredita papá eu vou ser tudo que visionaste para mim! Antes, a minha determinação e dedicação eram o meu combustível mas a tua perda muniu-me de poderes que eu serei unstoppable! Acredita! Pouca coisa me prende aqui mas antes de partir eu vou retribuir todo investimento e sacríficos que algum dia fizeste por mim. Sou grata a educação de qualidade que me deste, não só em casa mas nas escolas de propinas tão altas que os teus amigos que se denominam ‘endinheirados’ não eram capaz de tirar dos seus próprios bolsos para pagá-las. Mas, tu meu pai, eras capaz de abdicar de ter um carro 'top de gama' para por as tuas filhas nas escolas mais custosas. E por isso, serás sempre lembrado pelos teus gestos altruístas e o amor incondicional que nos deste.

 

No filme ‘Uptown girls’, uma menina tinha o seu pai num coma durante anos e a babá dela sugeriu que ela fosse visitá-lo e que rezasse ao seu lado. Ela assim o faz, mas infelizmente, no dia seguinte, o pai dela morre. A menina revolta-se contra a babá e acusa-lhe de ter provocado a morte do pai dela. No meu caso, eu quis atribuir culpas á nossa religião...foram tantas rezas e vigílias que resultaram em nada. Mas hoje entendo que quando a apóstola Tina foi rezar para ficares bem, o ‘ficar bem’ não significa que era desse lado. Mas sim do outro lado! Durante o teu coma, estavas numa quarentena espiritual, em que nós estávamos a puxar-te para aqui mas Deus estava a puxar-te para lá. E a corda rebentou... finalmente soltamos-te.

 

Papá tu faleceste no dia 4 de Julho de 2020 - este dia é o dia da independência dos Estados Unidos. E tornou-se também a nossa independência de ti. Temos todas que entender que já não estás aqui e temos que seguir! No calendário etíope, diferente do calendário gregoriano porque está atrasado 8 anos, o dia 4 de Julho de 2020 marcava dia 8 de Agosto/Outubro (?) de 2012. Se o mundo todo usasse esse calendário, entraríamos todos numa máquina do tempo e salvaríamos o ‘pai de todos’. Nesse dia, se fosse um dia de semana, de certeza que íamos jantar todos juntos e assistir todos a novela das 8h. Se fosse fim-de-semana, íamos todos ao Caputo e entre risadas e gargalhadas tiraríamos fotos, que hoje são nelas que encontramos força para seguir.

 

Não são só as fotos que me consolam, ás vezes sou invadida de gargalhas quando penso nas coisas que dizias ou na tua maneira de estar. Lembro-me que eras tão metódico que lias o manual de instruções antes de usares qualquer aparelho, e nós ríamos porque achávamos aquilo um absurdo. Eras tão racional que questionavas tudo...se eu partisse um copo perguntavas "partiste o copo porquê?", insistias até obteres uma resposta. Papá, eu parti tantos copos que escondi de ti, não tens noção! Partia copos todos os dias porque sou completamente desastrada/desorientada e hoje de facto, estou sem a bússola que me direcionava. Mas hoje é a minha vez de fazer uma pergunta "Morreste porquê?Porquê????” Será que na tua sine qua non extremista e no teu autismo consegues explicar o verdadeiro motivo da tua morte?

 

A tua morte foi extremamente radical! Sempre gostei de interpretar textos mas não consigo assimilar nada. Nunca vou obter respostas do além, mas não vou negar que tive avisos prévios. Eu imaginei isso tudo acontecer mas não sabia que o ‘brevemente’ que nos habituamos nas salas de cinema, estava tão próximo. Além dos sinais celestiais, posso confirmar também que existem anjos e tu foste um deles. Tu calaste as vozes diabólicas da minha cabeça; e salvaste-me da repercussão de rótulos precipitados e de todas as emboscadas que a vida me pôs. A tua salvação vinha como um abraço, conselho, apoio, e compreensão. E eu te agradeço papá!

 

E hoje estou a ser salva pelos anjos que mandaste. Anjos como a Ruth (minha amiga de Addis) que me acolheu como se tivéssemos uma amizade de mais de dez anos; e os anjos que espalham 'condolências'. Condolências...Essa palavra matou-me naquele momento, mas hoje ver mensagens dessas salvam-me. Mensagens de pessoas que não via há anos, mas que tiraram um pouco do seu tempo para fazer-me sentir bem. 

 

Sabes papá, todas as memórias contigo são paradigmas e simetrias para encarar a tua morte. Por exemplo, quando deixei de fazer parte do pacote de férias em família, achei que estava a tornar-me adulta por prezar pela minha privacidade mas hoje anseio pela vossa presença. Perdi tantas férias em família mas tu me incluías sempre. Fazias questão que eu estivesse a par de tudo, ligando para mim e informando-me de tudo – “Lunga estamos aqui no resort X... a Tiffany acabou de dar um pino”. Mas o mais difícil não foi estar sozinha enquanto vocês gozavam férias, mas sim agora. Sinto-me muito sozinha, mas entendi que eu precisava de encarar a minha dor em solidão e em silêncio, na biblioteca do luto, e assim, estudá-la com calma.

 

A morte nos cega de uma maneira que não conseguimos ver nada de bom mas se eu prestar atenção, e olhar com o teu olho detalhista enxergarei que houve perfeição no teu desfecho. Quando era miúda várias vezes me perguntei porquê que a Nayma não vivia connosco, mas ao longo da vida entendi. E agora nos teus últimos dias, foi ela que esteve contigo até ao teu último respirar. Por ser a ‘primeira’, Deus deu-lhe a tarefa mais difícil. Sinceramente não teria a força que ela teve porque acho o processo todo da morte desumanizante, em que o corpo torna-se simplesmente mais um corpo. Como é que um homem cheio de vida, morre? O Tó mesmo?

 

Papá, eu sempre achei que era capaz de qualquer trabalho voluntário, por já tê-lo feito. Se todo trabalho comunitário visa um mundo mais justo e solidário, te doar ao céu foi o comprometimento mais cívico que eu algum dia já fiz. Eras o nosso bem mais valioso e por isso considero a tua partida, o nosso maior gesto de caridade. Tu puseste os standards de homem tão altos, que nunca vou encontrar alguém que se compara a ti. E se um dia conhecer alguém que tenha pelo menos 1% da tua pureza, não sei se vou ter a coragem de entrar num matrimônio, sabendo que tu nunca vais me levar ao altar ou conhecer o meu filho.  

 

Tenho tantas saudades, principalmente de te ver a sorrir. Ficavas contente com poucas coisas papá: acordar uma hora mais tarde; ver um filme do Denzel Washington; ler um bom livro; ou uma sentada em família. Eu só queria que fosses feliz e sei que foste! Não queria que sentisses nenhuma dor e só de imaginar a apanhares uma injeção, frustrava-me. Não queria que o meu papá perfeito sentisse nem sequer uma ‘pitada’ de dor. Parece um amor exagerado, não é? Mas o meu pai retribuía todo esse amor dando-nos uma atenção excessiva: “Tudo bem Lunga? O que fazes?”. E acreditem que esse “O que fazes?” não era só para fazer conversa, era mesmo porque ele queria saber. Falávamos sobre tanta coisa, fofocávamos tanto...eras tão fofoqueiro meu Deus! Eras a pior pessoa para guardar segredo. É impossível falar de ti sem usar humor porque sempre que falávamos era gargalhadas atrás de gargalhadas. Rias com o corpo todo e espelhavas o quanto eras feliz e isso dá-me paz...

 

Numa das tuas recaídas e idas a clínica disseram-me que pregavas desesperadamente “O que vai ser das minhas filhas?”. Papá, tudo vai correr bem, não te preocupes! Nos deixaste ferramentas suficientes para sermos ‘alguém’. Não vamos ser nem metade do que foste mas vamos tentar. Isso garanto-te! Transformas-me completamente - de uma pessoa que tinha medo de tudo, até da sua própria sombra, hoje não tenho medo de nada! Não há nada que possa me derrubar.

 

Tu sabias o que estavas a fazer, e por isso, nos deixaste força, e nos preparaste para cuidar dos mais novos. Deixaste também a tua maneira singular de ver a vida, em que vida se torna como a encaramos. Exemplificando, já repararam que letras de músicas Gospel com um outro instrumental podem tornar-se roteiros de filme de terror? “Parece que é o fim (...) Quando você sente medo, do teu lado eu estou (...) Sonda-me, quebranta-me(...)“ (creepy, não?). Espero que entendam a analogia. 'Se fizermos da vida uma festa, a vida será uma festa. Se fizermos da vida um óbito, a vida será um óbito'. Papá, tu vais ser sempre o assunto que vai me perturbar, mas também serás a razão dos meus sorrisos.

Falando em filme de terror, lembraste de quando me explicaste a diferença entre as categorias de filme ‘terror’ e 'horror’. Disseste que terror é o medo e a ansiedade de que algo de mal vai acontecer, por outro lado, horror é a repulsa que ocorre depois de viveres algo assustador. Papá, para ser sincera na altura, não tinha entendido, mas hoje vejo que te perder foi um terror e continuar a viver sem ti está a ser um horror. E nesse horror em que vivo, e em que me desespero por ainda não ter tido a oportunidade de sonhar contigo, entendi que não apareces para mim porque foi tudo dito, não há nada que faltou dizer...todos os dias eu deixava bem claro que eu te amava!

E era um sentimento recíproco porque tu demonstravas constantemente o quanto nos amavas. Lembras-te de quanto a tia Mascote pressionava-te a ser mais rígido connosco? E tu nada! Nunca batias o pé. Sei que nos estragaste papá, mas eu sei que no fundo sabias que o mundo já era tão duro connosco que não era necessário seres tão severo em casa. Era a tua maneira de nos poupar, de tentar fazer o nosso mundo melhor.

Se eu tivesse que descrever a tua morte seria assim: Eu a andar com aquele meu 'ando' peculiar sustentado pela arrogância saudável de ter um pai que me dava uma overdose de amor e de repente, alguém puxa um tapete e diz “Tu és nada!”. Bem-feita para mim! Porque eu me sentia superior por ter um pai presente e por ter mimos infinitos, e hoje eu sou mais uma órfã de pai.

Dói tanto papá! É uma dor hostil... e quando algo dói queremos mostrar a dor, e para tal gritamos. Mas não adianta gritar, não adianta escrever, não adianta fazer nada! Antes o meu refúgio para tudo era por as coisas no papel, para ficar decretado o sentimento e esperar ajuda. Porém, por mais que eu escreva sobre ti, nada será capaz de amenizar a dor marcante de ver o teu nome marcado numa campa.

Sempre dei os pêsames, mas não sabia o que ‘pesava’, não tinha noção da dor. Espero que não estejas revoltado como eu, que aceitaste a tua morte da maneira que aceitavas todos sem julgamento. Vê a tua morte como um acto de fé, se calhar a tua morte vai evitar muitas outras mortes.

Há uns meses atrás falamos sobre o George Floyd, estavas revoltado com o incidente e pela tua voz de activista que não aceita injustiças, via-se que aquilo magoou-te profundamente. Se o George Floyd com quarenta e poucos anos foi assassinado por causa de 20 dólares; se o Tio Raúl nos seus trinta e poucos foi assassinado porque estacionou mal; se a nossa Ilva nos seus dezasseis anitos perdeu a vida só porque tinha vontade de comer banana pão; se o Bubas não chegou a fazer trinta anos e perdeu a vida ‘do nada’, de uma maneira tão estúpida; temos que dar graças a Deus por termos te tido por 60 anos.

Se empatia é sentir pelo outro e de alguma maneira comparar-se à situação do próximo, eu encontrei na empatia que me herdaste, a aceitação. Eu tenho que aceitar a tua morte da mesma maneira que outras famílias que não foram tão sortudas aceitaram. Não podemos deixar de agradecer, tivemos uma sorte que muitas pessoas não tiveram. Faleceste numa cama, a dormir, em paz...não poderia pedir desfecho melhor para o meu rei. Há pessoas que são encontradas na rua, que têm acidentes e os seus corpos são atirados á estrada.

Papá, o que me consola é que os teus irmãos tiveram-te por 60 anos porque eras o ‘cassule  dos rapazes’. A Nayma teve-te por trinta e dois anos, apesar da Tiffany só te ter tido por dezoito anos, e o Erick por doze. Porém, aqueles quatro anos nos Estados Unidos foram essenciais para o crescimento deles e saberem o pai que tinham. 

 Eu tive-te por 28 anos exactos, nem mais e nem menos, porque este atentado ocorreu exactamente cinco dias depois de completar 28 anos. Ás vezes quando fraquejo e perco estabilidade emocional e vou a procura de razões para sofrer, lembro-me que não tiveste a oportunidade de me desejar ‘Parabéns’ mas isso foi só um detalhe, um pequeno lapso numa vida rodeada de mimos excessivos e de usufruir da sensação maravilhosa de chamar "Papáaaaaaaaaaaaaaa".

 

Saudades! E sei que vão ser maiores quando vir o Man Dico a dançar; quando a Tia Guida me der uma cotovelada; quando a Joana convidar-me para ir ao cinema; ou quando a mamã começar a sua bajulação habitual, e gabar-se "Quem vos dera ter um Tó como o meu...". Sei que nunca vai sarar, e que vai se tornar numa dor latente. Mas, como toda a adversidade, sei que se aproxima uma estação de paz. E esse tempo que ansiamos vai trazer maturidade, maturidade essa que podia ter sido alcançada mais cedo se tivesses sido mais rígido connosco, mas prontos. Vou encarar a tua morte como a ‘surra’ que nunca tive, mas que sempre mereci.


Só mais uma coisinha... a mamã disse que antes de entrares no bloco operatório disseste “Estou paiado”. Não estás nada papá, sei que não vai faltar companhia para um ‘txilo’, sei que estás com o meu padrinho (Tio Mingo), com o Calili, o Tio Loló, o Tio Raúl, o Tio Calado, o Tio Eugénio, o Tio Joãozinho, a Tia Fatinha, e o Tchiza, e vão organizar um ambiente ‘rijo’. Vai cuiar!

 


“Estou todo embriagado...”

“Cuméh Lunga, não bebes nada?”

“Quem vai pagar o deejay?”

“Eu estou quase a me tornar um super-homem...”

by Papá

 


Era uma vez um homem que deixou tanto amor na terra que nós nunca seremos os mesmos... Descansa em paz Tovata...Foi bom!




Oi Papá Oi Papá Reviewed by Lunga Noélia Izata on agosto 04, 2020 Rating: 5

27 comentários:

  1. Ohh Lunga...This blog is quite heavy but am glad that you are healing and just as you said you're unstoppable..Only God knows why everything happens..and as you heal I believe there's so much light within you to make the world better...It's funny how even in loss we tend to have gratitude..I believe Papa is proud of who you are and most of all the great woman God purposed you to be..

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    1. papa is definitely proud...thank you peace...hope you are good

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  2. 😭 o teu pai é um exemplo a seguir... obrigada por ter partilhado, hoje depois de ler o que escreveste quero continuar a lutar para ser uma pessoa melhor que ontem fui

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  3. Oh Lunga... não tenho palavras

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  4. Lunga your dad was such a special person that he will be forever in our hearts. We will remember him for his kind soul, funny heart or intelectual side. May his soul rest in peace.

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    1. thank you so much for your words...if you dont mind me asking, who is this because it says 'unknown'

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  5. Triste e emocionante minha sobrinha! Sente-se que cada palavra saiu-te da alma e do coração ⁨Lunga Noélia.Deves continuar a escrever sempre que te lembrares dele. Vai aliviar o teu coração. És uma menina muito forte e corajosa. Que a alma do Tovata descanse em paz ao lado do Senhor. Deus te abençoe profundamente ��❤

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  6. Tive o prazer de receber o tio para reunioes do meu servico, e ele chegava sempre com muito carinho a chamar por mim "Gwendoline". E eu sempre bem orgulhosa a dizer para todos que era meu tio.
    Ele estará sempre a olhar por todos, até o dia em que formos ao encontro dele.
    Um beijo grande pra ti e que Deuste guarde e abencoe.

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    1. Gwen do homem-aranha lol... outro beijao para ti prima...love you

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  7. Só o tempo é quem vai sarar e preencher este grande vazio. A vocês so desejo força e coragem

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  8. You're such a strong woman and I wish you all the best in your career.

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  9. Além da comovente história, a narração foi de viajar. Parecia estar a ler 100 anos de Solidão de Gabriel Garcia Márquez. Abraços Lunga. Sucessos sucessivos.

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  10. Beijinhos Lunga. Estamos muito orgulhosos de ti.

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  11. Beijinhos Lunga. Estamos muito orgulhosos de ti.

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  12. Força minha sobrinha,conheço bem esta dor, perdi o meu pai 7 anos e a minha mãe a 4 anos nunca senti tamanha dor com agravante de assistir ela morrer. Eu costumo dizer que não tenho medo da morte, mas perder uma mãe ou um pai so Jesus para nos confortar. God bless you.

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    1. Oi tia...eu sempre tive medo da morte mas agora ja nao porque ja nao será morte mas sim o reencontro com o meu pai. sinto muito pela perda da tia e obrigada por partilhar comigo

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  13. Que "exprimir" foi esse?!
    Só consigo dizer que estás a ser muito forte e que o tio com certeza não se importará com os copos partidos escondidos. Cuidará sempre de todos ❤️

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About me

I am willing to share my own stories and use my platform to talk about movies, books, music, volunteering, traveling and relationships.

My first publication was a fiction novel ‘Sem Valor’ (meaning Worthless) where I addressed autism and prostitution; wrote a short-fiction story ‘Hello. My name is Thulani’ featured on ‘Aerial 2018’ about transgender issues and represents an allegory of identity crisis, meaning everyone is in transition to something; co-authored with six African authors on a motivational book ‘Destiny Sagacity’ about the power of destiny; my memoir ‘The story is about me’ tells my adventures volunteering in Uganda and staying with a family in the village of Wakiso; and my recent offering “Read my Book’ is a fictional approach to apartheid.

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